A seguir, serão explorados os principais aspectos do papel das Tregs no prognóstico, nos mecanismos de resistência e nas estratégias terapêuticas voltadas à sua modulação.
Tregs e prognóstico do câncer
O papel das Tregs nas diversas fases da carcinogênese tem sido amplamente estudado por refletir sua natureza ambígua, simultaneamente protetora e permissiva.2
Uma metanálise recente de 24 estudos em câncer de pulmão de células não pequenas (CPNPC) mostrou que menores níveis de Tregs correlacionam-se com melhor sobrevida global e livre de recorrência.3 Em câncer de mama receptor hormonal positivo, foi demonstrado que a heterogeneidade funcional das Tregs vai além de sua densidade: uma subpopulação expressando a variante de splicing FOXP3 Exon 2 (FOXP3E2), com maior capacidade imunossupressora, associou-se a pior sobrevida.4 Esses achados reforçam que não apenas a quantidade, mas o perfil molecular das Tregs influencia o desfecho clínico.
O impacto prognóstico, entretanto, varia conforme o tipo tumoral. Em uma metanálise de 17 estudos envolvendo 3.811 pacientes com câncer colorretal, alta densidade de Tregs FOXP3⁺ no estroma e epitélio tumoral correlacionou-se positivamente com a sobrevida global em 1, 3, 5 e 10 anos.5 De modo semelhante, análises histológicas em tumores ressecados mostraram que a relação CD8/FOXP3 intratumoral é marcador independente de sobrevida global (HR=0,43; IC de 95%: 0,19-0,95), indicando que tumores com predomínio de linfócitos citotóxicos e escassez de Tregs apresentam melhor controle imune.6
Tregs e resistência à imunoterapia
Há evidências robustas de que Tregs participam da resistência à imunoterapia. Em carcinoma renal de células claras metastático, maior fração de Tregs PD-1⁺ intratumorais associou-se a piores desfechos com nivolumabe: sobrevida livre de progressão de 3,19 versus 5,78 meses (p=0,021), sobrevida global de 18,1 versus 27,7 meses (p=0,013) e taxa de resposta de 12,5% versus 31,3% (p=0,059), indicando ausência de benefício quando Tregs PD-1⁺ predominam.7
Em câncer gástrico, o bloqueio de PD-1 com nivolumabe pode expandir Tregs PD-1⁺ altamente proliferativas (Ki67⁺) em pacientes com hiperprogressão, além de aumentar a atividade supressora dessas células in vitro e em modelos murinos, sugerindo um mecanismo importante de escape.8
Estudo translacional recente mostrou que Tregs infiltrantes em tumores de pulmão e pele exibiram reprogramação transcricional imunossupressora após o bloqueio de PD-1/PD-L1, com aumento da expressão de CTLA-4, TIGIT, LAG-3 e CD39, correlacionando-se com ausência de resposta clínica. De forma consistente, pacientes não respondedores com câncer de pulmão e mesotelioma apresentaram expansão de Tregs PD-1⁺ Ki-67⁺ no sangue periférico, evidenciando que o bloqueio de PD-1/PD-L1 pode inadvertidamente potencializar a atividade supressora dessas células, contribuindo para resistência adaptativa à imunoterapia.9
Tregs como alvo terapêutico
A compreensão do papel das Tregs estimulou o desenvolvimento de estratégias de modulação seletiva, visando reverter a resistência imunológica e restaurar a atividade antitumoral.
A abordagem mais antiga, o uso de ciclofosfamida em baixa dose (metronômica) em pacientes com tumores avançados demonstrou capacidade de induzir apoptose de Tregs. Em estudos iniciais, o tratamento resultou em diminuição significativa dos Tregs circulantes após quatro semanas, com melhora da proliferação e da citotoxicidade de células efetoras, embora o efeito fosse transitório e heterogêneo entre pacientes. Ensaios posteriores combinaram o fármaco a vacinas tumorais e bloqueio de checkpoints, mas sem impacto consistente em sobrevida global, reforçando que, apesar de acessível e seguro, o efeito imunomodulador da ciclofosfamida permanece limitado fora de protocolos experimentais .10
Nos últimos anos, o foco da imunomodulação se voltou para intervenções capazes de atuar diretamente sobre o microambiente tumoral. Entre essas estratégias, o bloqueio da via da adenosina (CD73/CD39/A2A) desponta como uma das abordagens mais promissoras.
No ensaio COAST (fase 2, n=189), conduzido em pacientes com CPNPC estágio III, a combinação de durvalumabe + oleclumabe (anticorpo anti-CD73) promoveu melhora significativa da sobrevida livre de progressão (HR=0,59; IC de 95%: 0,37-0,93) e taxa de resposta objetiva superior (35% versus 23,9%) em comparação ao durvalumabe isolado, sem aumento de eventos adversos de grau ≥ 3.11
Além dessa via, estratégias avançadas de modulação seletiva de Tregs ganharam destaque na ESMO 2025, reforçando o interesse na depleção intratumoral controlada como um novo eixo da imunoterapia. Nesse contexto, anticorpos anti-CTLA-4 de nova geração, como botensilimabe e HBM4003, demonstram capacidade aprimorada de reduzir Tregs intratumorais e potencializar a ativação de linfócitos efetores. A combinação botensilimabe (anticorpo anti-CTLA-4 Fc-otimizado) e balstilimabe (anticorpo anti-PD-1) foi avaliada em um estudo multicêntrico de fase Ib envolvendo 123 pacientes com câncer colorretal metastático microssatélite estável sem metástases hepáticas ativas. A taxa de resposta objetiva foi de 20%, com 42% dos pacientes vivos em 24 meses e mediana de sobrevida global de 20,9 meses.12
Esses avanços consolidam uma mudança de paradigma na imunoterapia oncológica: o futuro não depende apenas de intensificar a ativação de linfócitos efetores, mas também de modular com precisão o controle imunológico imposto pelas Tregs, direcionando a resposta imune de forma seletiva, eficaz e segura ao microambiente tumoral.
Referências:
2 de dezembro de 2025
/2 min. de leitura
2 de dezembro de 2025
/2 min. de leitura
2 de dezembro de 2025
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